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Entrevista de Marta Harnecker com Lorena Peña

Entrevista de Marta Harnecker com Lorena Peña (Comandante Rebeca), das Forças Populares de Libertação “Farabundo Martí”




— Quais são, na sua opinião, as principais reivindicações que deve levantar o movimento feminino revolucionário na América Latina? Há quem sustente que as dirigentes femininas salvadorenhas e nicaragüenses politizam demais os problemas da mulher, e não lutam ou consideram secundário lutar por reivindicações propriamente femininas. O que você pensa a respeito disso, agora que tem essa experiência da reunião de mulheres no México?


— Sobre isso das principais reivindicações do movimento feminino revolucionário na América Latina, eu parto do pressuposto de que, naturalmente, suas primeiras reivindicações, as estratégicas, são as de transformação social, porque mantenho que todo esse pleito será em vão se não se luta por transformações profundas. É como se o operário só ficasse no nível da luta econômica.


Não acredito que se deva separar a luta do movimento feminino da luta pelas transformações da sociedade. Essa é uma tarefa de homens, mulheres, jovens. Agora, contrapor as reivindicações das mulheres a essas é pior ainda. Evitá-las é um erro, mas é um erro maior ainda contrapô-las, porque aí você cai no jogo do feminismo burguês, que só briga por reivindicações de tipo imediato, setorial, e deixa de lado o problema de fundo, que não é nenhuma varinha mágica, mas é onde são criadas as condições básicas para poder falar de uma superação estável e duradoura da situação da mulher.


Entre essas reivindicações que têm a ver com as transformações da sociedade, em nosso caso, está a demanda pela desmilitarização, a democratização da sociedade, a justiça econômico-social, a soberania nacional... a elas, é preciso agregar as reivindicações específicas da mulher, que não são devidamente consideradas: a igualdade de oportunidades no trabalho, a igualdade de salário, a socialização dos deveres no lar entre homens e mulheres, a criação de mecanismos transitórios de formação e capacitação de mulheres – por exemplo, das donas de casa – para que possam se desenvolver não só no trabalho político, mas nas empresas, no trabalho produtivo. Todas essas são demandas que as mulheres podem e devem levantar.


O direito a participar plenamente em todo o desenvolvimento político, econômico e social me parece uma reivindicação justa. Do mesmo modo que, enquanto se transformam todas as condições, se criem condições de ajuda material para a mulher. Agora, não me venha dizer que a máquina de lavar me ajuda, porque aí você está partindo do pressuposto de que eu sou a encarregada de lavar a roupa. As lavadoras devem ser uma ajuda para resolver os problemas não da mulher, mas da família, que já é outro caminho. Por que o casal não pode compartilhar essa tarefa?


Devem ser criados esses mecanismos transitórios, mas fazendo consciência que é de ajuda à família, ao homem e à mulher, na medida em que se constrói a igualdade de responsabilidades homem-mulher.


O problema é que como tudo isso foi marcado pelo feminismo burguês, no caso da FMLN, há um tipo de alergia a tudo que sejam reivindicações da mulher, isso apesar de existirem umas quinze organizações de mulheres agora em El Salvador. As organizações cresceram, elaboraram teoria, têm posição sobre o problema da paz, da guerra, da justiça social, sobre seu problema particular e é tempo de incorporarmos isso.


Eu sei que nós, as mulheres do FMLN, nos desinteressamos pelo problema da mulher. Ouvi cada declaração que me dá alergia. Até caímos na ridicularização da luta da mulher. Uma vez, ouvi uma compa dizer: “Não, primeiro é a revolução, e depois que o homem cozinhe”. E uma companheira que está em uma frente lhe respondeu: “Eu sei cozinhar muito bem, meu problema é como participo no desenvolvimento global da sociedade”.


Há uma tendência em nós a dizer que primeiro é a luta pela revolução e depois a luta da mulher. Eu penso que elas devem ir juntas. Não sou partidária do feminismo “radical”, ao estilo burguês, mas essa afirmação de dizer que primeiro é uma coisa e depois a outra me parece ilógico e injusto, porque, como você vai afirmar que é preciso deixar o imediato pelo estratégico, quando é preciso combinar as coisas?


*Trecho da entrevista com Lorena Peña (Comandante Rebeca), das Forças Populares de Libertação “Farabundo Martí”, realizada por Marta Harnecker, em Novembro de 1990, com o título "Os Desafios da Mulher Dirigente"


**Tradução de Maria Júlia A. G. Montero.


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